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terça-feira, 4 de outubro de 2016

"Esperança nas Exceções"

Tudo o que me sobra é a esperança nas exceções, Edivaldo Ferreira.

Conheci o autor e poeta Edivaldo Ferreira num lugar inusitado, em seu trabalho, que é uma arte, a arte de sommelier de cerveja. Indicações perfeitas de acordo com a perspicácia e sabedoria que lhe são devidas. As indicações não param por aí... Admirador de jazz e rock, teatro, cinema, literatura, descobri que também é um escritor, tradutor e lançou um livro de poesias que me deixou surpresa pelo potencial do conteúdo à métrica, estrutura poética. 
As surpresas não param por aí...Um belo dia, ensolarado, eis que vejo um post com textos dele, Edi, para os amigos...Me emocionei, lágrimas que me encheram os olhos...

Compartilho o projeto do blog https://caosdescrito.wordpress.com/2015/09/02/pb/


Desenhar flores coloridas nas paredes da cidade cinza era um ato de rebeldia que ela praticava regularmente nas tardes em que cabulávamos aulas de Literatura, eu perguntava se não seria mais revolucionário plantar flores de verdade pela cidade e ela sorria e dizia que não dava tempo de esperar, que tinha pressa, com as tintas spray era fácil deixar o mundo mais bonito, mais colorido. “Que diferença faz um mundo bonito desenhado com linhas tortas numa parede descascada?”, eu me perguntava. A gente cresceu e envelheceu e eu me esqueci do seu rosto e agora minha filha teima em correr naquela rua de paralelepípedos contando as flores desenhadas na parede, que apesar do tempo, continuam ali. Eu também continuo por aqui, morando na mesma rua. Casei com uma mulher que não amo e tenho um trabalho que não gosto. Eu me deixei levar pelas regras desse jogo que a gente é obrigado a jogar no instante em que nasce e aqui estou eu, um funcionário medíocre com uma vida medíocre que todas as noites se esforça, sem sucesso, para lembrar orações que aprendeu quando criança. Outro dia numa livraria vi o nome dela, da garota que pixava flores coloridas, na capa de um livro de fotografias. Mas estavam todas em preto & branco. Vi escrito lá que ela viajou pelo mundo visitando florestas e tribos que têm pouco ou nenhum contato com o homem civilizado, sorte a deles. No fim do dia quando me debruço sobre textos inacabados que acabam no fundo da gaveta, cartas que eu nunca vou enviar ao lado de contas vencidas, enquanto escuto minha filha brincando na sala e penso sobre o tipo de ser humano que ela vai se tornar, tudo o que me sobra é a esperança nas exceções, uma planta nascendo no asfalto de uma cidade morta.
Foto: Matheus Cappellato / Texto: Edivaldo Ferreira

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